segunda-feira, 18 de outubro de 2021

O choque cultural dos portugueses ao chegarem na África

 

Os portugueses ao chegarem na África espantaram-se com o tamanho de algumas cidades yorubas como Ijebu Odé na Nigéria e sua muralha defensiva de 130 quilômetros conhecida como Eredo Sungbo, podendo alcançar a altura de set metros em alguns trechos. A muralha segundo lenda teria sido construído em homenagem a Bilikisu Sungbo que alguns identificam com a personagem bíblica rainha de Sabá do tempo de Salomão. Os Lusíadas de Camões e o livro Décadas do cronista João de Barros descrevem o grande comércio dos portos africanos no século XV quando da chegada dos portugueses.[1] No Congo, o rei ou manicongo Nzinga a Nkuwa (João I do Congo na figura) reconhecendo a superioridade técnica dos portugueses com a chegada de Diogo Cão em 1491 conclui que o deus dos portugueses era superior e logo se converteu ao cristianismo solicitando a vinda de padres para catequização de seu povo.[2] O diário de bordo de Vasco da Gama em 1498 registra que os navios árabes que frequentavam a costa oriental da África, aproveitando-se das monções, não usavam pregos, todo seu madeirame era fixado por cordas feitas de fibra de casca de coco. Havia um temor lendário de que no canal de Moçambique que se forma entre o litoral africano a costa de Madagascar (ilha da Lua) haveria uma gigantesca pedra íma em seu fundo que poderia despergar todos os pregos de uma embarcação, pela mesma razão que os navios não carregariam qualquer canhão. Eduardo Bueno, contudo, levanta a hipótese de que esta lenda esconderia a razão principal que seria a escassez de ferro na Arábia. Por ter vencido todas as lendas que cercavam a travessia deste canal, o navegador árabe Ibn Majid renomeou o nome do canal, antes conhecido como “canal do medo” passando a se chamar “passagem dos francos” em homenagem aos europeus portugueses. Os portugueses foram bem recebidos pelo sultão de Moçambique que imaginava tratarem-se de muçulmanos vindos da Turquia. Segundo o diário de Vasco da Gama “depois que souberam que éramos cristãos ordenaram que nos capturassem e matassem à traição”.[3] Para a viagem de Melilnde na costa oriental africana até Calicute na Índia os portugueses contariam com a presença do cartógrafo árabe Ahmed ibn Madjid, segundo o relato de João de Barros e que no diário de Álvaro Velho da frota de Vasco da Gama é identificado como sendo um mouro[4], grande conhecedor da cartografia da região e autor de Diretório Náutico publicado em 1490, um compêndio da ciência náutica árabe. Jaime Cortesão destaca como crucial esse conhecimento para o sucesso do empreendimento português e que paradoxalmente levaria a derrocada da navegação árabe no oceano Índico.



[1] SILVA, Alberto da Costa. A África explicada aos meus filhos, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013, p. 40

[2] SILVA, Alberto da Costa. A África explicada aos meus filhos, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013, p. 46

[3] VELHO, Álvaro. O descobrimento das Índias: o diário da Viagem de Vasco da Gama, Rio de Janeiro: Objetiva, 1998, p. 58, 146

[4] VELHO, Álvaro. O descobrimento das Índias: o diário da Viagem de Vasco da Gama, Rio de Janeiro: Objetiva, 1998, p. 73, 151



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