quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Calendário no Egito antigo

 

Carroll Quigley observa que a previsão de enchentes do Nilo conferia prestígio e poder aos sacerdotes astrônomos: “a ignorância da maioria tornou fácil para os possuidores desse conhecimento especializado usá-lo como prova de que possuíam poderes sobrenaturais”. A irregularidade quanto a data de início da inundação (hapi)[1] fez com que os egípcios buscassem o nascer helíaco de Sírius como marcação do início da estação das cheias[2]. O intervalo de tempo entre dois Nilos era de 365 dias o que levou a criação de um calendário com o primeiro dia do mês de Thoth como o primeiro dia do ano novo[3], no início do verão, normalmente em torno do dia 19 de junho quando a estrela da deusa Sepdet (Sopdet, Sírius, grego Sothis) reaparecia ao amanhecer quando o nível do Nilo começava a crescer.[4] O nascer helíaco marca primeira aparição anual de um astro sobre o horizonte oriental e no Egito o nascer helíaco de Sírius marca o início da canícula, o período das secas.[5] Lubicz contesta que os egípcios pudessem identificar a inundação do Nilo pela saída da estrela Sírius junto ao Sol pois as estrelas não são visíveis ao dia, a única forma de determinar a aproximação de Sírius seria por cálculos baseados em observações astronômicas.[6] Charles Muses observa que o glifo usado para representar a estrela Sirius é o mesmo sinal que significa “estar preparado”, enquanto a palavra usada para estrela – sbz significa quando associado a um par de pernas, o mesmo que porta, passagem[7], ou seja, as estrelas eram vistas como aberturas para o mundo após a morte. O encantamento 821 dos textos das Pirãmides identifica o rei com Sirius: “Ó rei, tu és esta grande estrela, a companheira de Oron, a que atravessa o ceu com Orion”[8]. Depois de quatro anos (tetraeteris) a diferença acumulada entre o calendário civil de 365 dias (composto de três estações de quatro meses cada uma e trinta dias cada mês, acrescentada de cinco dias suplementares) e o tempo real era de um dia a cada quatro anos. Em quarenta anos essa diferença seria de dez dias, em 1460 anos (365 x 4 = 1460) essa diferença seria de um ano.[9] Este período de 1460 anos era conhecido como ciclo sótico ou ciclo de Sothis (grego) ou Sopdet no Egito Antigo.[10] È somente após 1460 anos que o ano novo e as estações naturais voltam a coincidir. Os egípcios foram capazes de calcular que o início da estação cheia, o nascer do sol e o da estrela Sírius aconteceriam simultaneamente uma vez a cada 1460 anos.[11] A observação anual do atraso do nascer helíaco da estrela Sothis em relação ao calendário fez com que o ano egípcio correspondesse a 365,25 dias ou 365 dias e 6 horas muito próximo do valor 365 dias e 5 horas e 48 minutos. Daniel Boorstin destaca que o calendário egípcio apesar de que cada mês atravessa todas as estações em um ciclo de 1460 anos era muito melhor do que qualquer outro conhecido à sua época e acabou sendo adotado pelos romanos quando Júlio Cesar adotou o calendário juliano, sendo ainda usado por Copérnico nas suas tábuas planetárias no século XVI.[12] Quanto ao calendário lunar egípcio (354 dias) ele era utilizado para estabelecer o calendários das festas.[13]

[1] JOHNSON, Paul. História Ilustrada do Egito. Rio de Janeiro:Ediouro, 2002, p. 13

[2] TATON, René. A ciência antiga e medieval, São Paulo:Difusão, 1959, tomo I, v.I, p. 50

[3] STEVERS, Martin. A inteligência através dos séculos. São Paulo:Globo, 1946, p.557

[4] STROUHAL, Eugen. A vida no antigo Egito. Barcelona:Folio, 2007, p. 91, 240; JOHNSON, Paul. História Ilustrada do Egito. Rio de Janeiro:Ediouro, 2002, p. 36

[5] MOURÃO, Rogério. Dicionário de astronomia e aeronáutica, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, p.559

[6] ALVAREZ, Lopez. O enigma das pirâmides, São Paulo:Hemus, 1978, p.114

[7] WEST, John Anthony. Em defesa da astrologia, São Paulo:Siciliano, 1992, p. 61, 420

[8] EDWARDS, J. As pirâmides do Egito, Rio de Janeiro:Record, 1985, p.253

[9] SARTON, George. Ancient Science Through the Golden Age of Greece, New York:Dover, 1980, p.29

[10] ALVAREZ, Lopez. O enigma das pirâmides, São Paulo:Hemus, 1978, p.117; ONCKEN, Guilherme. História Universal. História do Antigo Egito, v.I, Rio de Janeiro:Bertrand, p.108

[11] DEARY, Terry. Espantosos egípcios, São Paulo:Melhoramentos, 2004, p. 121

[12] BOORSTIN, Daniel. Os descobridores, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1989, p.21

[13] Desplancques, Sophie. Egito Antigo (Encyclopaedia) . L&PM Pocket. Edição do Kindle, 2021,  p.185/1492



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