quinta-feira, 23 de setembro de 2021

A pratica das queimadas entre os indígenas antes da chegada de Cabral

 

Segundo Gabriel Soares em Tratado Descritivo do Brasil de 1938 os tapuia eram desprovidos de todo e qualquer utensílio na agricultura exceto pelo uso de pau de ponta. Diversos autores como Southey, Saint Hilaire e Varnhagen ressaltam a prática da agricultura brasileira da coivara entre os índios.[1] Frei Vicente Salvador destaca a agricultura predatória adotada pelos colonizadores portugueses que usam a terra “não como senhores, mas como usufrutuários, só para desfrutarem e a deixarem destruída [...] Donde nasce também que nem um homem nessa terra é republico, nem zela ou trata do bem comum, senão da um do bem particular”.[2] Saint Hilaire no século XIX descreve que “todo o sistema da agricultura brasileira é baseado na destruição das florestas e onde não há matas não existe lavoura”.[3] Segundo Thevet, “é assim que preparam suas terras para o cultivo: primeiramente, cortam sete ou oito jugadas de mato, deixando de pé apenas as árvores mais altas que um homem. Depois ateiam fogo nos troncos e ervas, roçando e limpando todo o terreno. Em seguida sugam a terra com certos instrumentos de madeira (ou de ferro, depois que tiveram conhecimento destes). Em seguida, as mulheres plantam o milho indígena e certas raízes chamadas etique (batata-doce), escavando com o dedo uma cova, como se usa entre nós quando plantamos ervilhas e favas”.[4] Betty Meggers contudo, contesta que se possa designar as técnicas de derrubada, queima e coivara indígenas como predatórias: “é uma técnica especializada que se desenvolveu em resposta às condições específicas de clima e solo tropicais”. Os desmatamentos eram sempre em pequenos lotes e que deixam galhos  e troncos para apodrecer paulatinamente e assim não expor o solo à irradiação solar e ao impacto das chuvas e erosão. O uso da queimada em pequenas escala e o uso da estaca de cavar ao invés da enxada ou do arado, evita que se elimine o humus da terra e com isso a evasão de nutrientes. A derrubada de áreas descontínuas da mata, por sua vez, favorece a multiplicação da caça.[5]

[1] SCHMIDT, Carlos Borges. Técnicas agrícolas primitivas - III, Diário de São Paulo, 06/03/1960 http://docvirt.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=tematico&pagfis=43587&pesq=&esrc=s

[2] FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro, v.1, São Paulo:Ed. Globo, 1975, p.143, 153

[3] HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil monárquico: declínio e queda do império, t.II, v.4, São Paulo:Difusão, 1971, p.92

[4] THEVET, André. Singularidades da França Antártica a que outros chamam de América. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1944. p. 217. (Coleção Brasiliana). Cf. MIRANDA. Carlos Alberto Cunha. A arte de curar nos tempos da colônia. Recife:UFPE, 2017, p.209

[5] FILHO, Ivan Alves. História pré colonial do Brasil, Rio de Janeiro: Europa Editora, 1987, p.240



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