terça-feira, 17 de agosto de 2021

Nos ombros de gigantes

 

Bernard de Chartres em 1114 exprime sua confiança no progresso: “Somos anões empoileirados nos ombros de gigantes. Vemos assim mais que eles e mais longe que eles, não porque nossa vista seja mais aguda ou nossa estatura mais alta, mas porque eles nos elevam até o nível de sua gigantesca altura”.[1] Pedro de Blois em 1153 em pleno renascimento do século XII, retoma a mesma analogia: “malgrado os latidos dos cães e os grunhidos dos porcos, eu não cessarei de imitar os escritos dos antigos; eles serão minha ocupação e, tanto quanto minhas forças o permitirem, o sol jamais me encontrará ocioso. Nós somos como anões, montados sobre os ombros de gigantes, por seu favor nossa vista alcança mais longe do que a deles, quando, apegando-me às obras dos antigos, restituímos à vida os seu mais elegantes pensamentos, que o tempo ou a negligência dos homens tinham deixado morrer”.[2] Jacques Verger considera contudo que esta perspectiva de progresso no conhecimento  permanecia pouco comum, especialmente após o século XIII quando uma “concepção conservadora e bloqueada do saber parecia predominar”.[3] Para Jacques le Goff o intelectual do século XII tem como principal técnica a imitação dos antigos. Gilbert de Tournai escreve: “Jamais encontraremos a verdade se nos contentarmos com o que já está descoberto [..] os que escrevem antes de nós não são senhores, mas guias. A verdade está aberta a todos, ela ainda não foi inteiramente possuída”. Ainda segundo Gilbert: “escrevo, somente para vós, homem sem ideias preconcebidas, que sabeis verdadeiramente filosofar, que procurais a ciência, não apenas nos livros, mas nas próprias coisas, é para vós que escrevi estes princípios do magnetismo, oriundos de uma nova forma de filosofar”.[4] Charles Singer resume a redescoberta da sabedoria dos antigos: “a imitação ao invés da criação era a atitude mental da maior parte dos eruditos do século XV”.

[1] LE GOFF, Jacques. Os intelectuais na idade média. São Paulo:Brasiliense, 1989, p.25; JUNIOR, Hilário Franco. A idade média nascimento do Ocidente. São Paulo:Brasiliense, 1986, p. 144; PERNOUD, Régine. Idade Média: o que não nos ensinaram, Rio de Janeiro:Agir, 1994, p. 23

[2] JANOTTI, Aldo. Origens da Universidade, São Paulo: Edusp,1992, p.63

[3] VERGER, Jacques. Homens e saber na idade média, Bauru:EDUSC, 1999, p. 51

[4] TATON, René. A ciência moderna: o século XVII, tomo II, v.2, São Paulo:Difusão, 1960, p.19



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