Segundo Herbert Wendt: “daria para encher um livro a enumeração do que a Europa aprendeu dos árabes no decorrer dos duzentos anos em que houve as cruzadas: os europeus adotaram os algarismos indianos, que passaram a chamar de arábicos, começaram a adoçar e temperar os alimentos, passaram bordar as roupas e adornar as moradias com tapetes e gobelins, as armaduras foram substituídas por vestimentas de pano e de veludo, passaram a usar lenços para assoar o nariz, inventaram instrumentos de arco, danças, jogos de salão”.[1] Foulcher de Chatres em 1097 apresenta seu relato maravilhado da cidade de Constantinopla: “Seria muito longo e fastidioso dizer detalhadamente abundância de riquezas de todo tipo, de ouro, de prata, de tecidos de mil espécies e de relíquias sagradas que se encontram nessa cidade”.[2] Norman Pounds observa, um aspecto comumente ignorado na perspectiva etnocêntrica ocidental atual, a de que nessa época a Europa não estava na vanguarda do desenvolvimento técnico e cultural, posição ocupada pelo Oriente. Ao longo de milênio a agricultura mesopotâmica, o alfabeto fenício, a filosofia grega e a contabilidade árabe vieram do Oriente para o Ocidente, assim como cristianismo e islã. Havia um “gradiente cultural” do oriente para o Ocidente. Jean Mandeville viaja no século XIII em direção ao Oriente em busca do Paraíso. Os cruzados iletrados dos séculos XI a XIII encontraram um povo culto. Jacques le Goff contudo contesta esta perspectiva: “as cruzadas não trouxeram à Cristandade nem a expansão comercial nascida de relações anteriores com o mundo muçulmano e do desenvolvimento interno da economia ocidental, nem as técnicas e os produtos vindos por outros caminhos”.[3] Jules Michelet (figura) observa que as invenções da pólvora, papel, bússola trazidas dos povos bárbaros eram vistas como uma violência à obra de Deus: “os infiéis, renovando o pecado de Adão, recomeçaram a comer os frutos da árvore da ciência. Eles procuraram a salvação, não no milagre, mas na natureza; não na legenda do Filho, mas na criação do Pai”.[4]
[1] WENDT, Herbert. Tudo
começou em Babel, São Paulo:Difusão, 1962, p. 175
[2] LE GOFF, Jacques. A
civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 127
[3] LE GOFF, Jacques. A
civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 62
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