sábado, 3 de julho de 2021

Maiêutica socrática

 

A alma busca encontrar as ideias porque as contemplou no mundo da verdade eterna antes de ter encarnado.[1] Usando deste método Platão menciona uma cena em que Sócrates extrai de um jovem escravo por meio de perguntas, o reconhecimento de uma verdade geométrica.[2] A maiêutica socrática tem como significado “dar à luz”, “parir” o conhecimento (maîa, em grego, “parteira”) e pressupõe que "a verdade está latente em todo ser humano, podendo aflorar aos poucos na medida em que se responde a uma série de perguntas simples, quase ingênuas, porém perspicazes". Sócrates dizia ter herdado da mãe que era parteira de profissão a habilidade de fazer parir, não sobre corpos, mas sobre o espírito[3]. Se alguém pergunta: “o que é justiça ?”, Sócrates responde com outra pergunta do seu contrário: “como você se sente injustiçado ?”. O interlocutor responde: “quando me castigam sem que eu mereça”. Sócrates então prossegue: “mas quando você não merece ser castigado ?“, ou seja, ele pergunta quando esta situação não ocorre, ao que o interlocutor responde: “quando eu faço o que é correto”. Assim Sócrates levou seu interlocutor a chegar à definição de justiça. Segundo Platão no Teetetos: “nenhuma das parteiras assiste as parturientes quando ela mesma se encontra grávida [..] Toda a minha arte de obstetra é semelhante a essa mas difere enquanto se aplica aos homens e não as mulheres e relaciona-se com as almas da s partuirientes e não com os corpos. Sobretudo na nossa arte há a seguinte particularidade: que se pode averiguar por todo meio se o pensamento do jovem vai dar à luz a algo de fantástico e de falso ou de genuíno e verdadeiro [,,,] Deus obriga-me a agir como obstetra porém veda-me de dar a luz”, cabe portanto ao aluno que ouve o filósofo, dar a luz a verdade. Prossegue Platão: “E eu, pois, não sou sábio, nem posso mostrar nenhuma descoberta minha, gerada por minha alma; mas os que me frequentam a princípio ignorantes; mas depois, adquirindo familiaridade, como assistidos pelo deus, ontem proveito grande, como parece a eles próprios e aos outros. E não obstante é manifesto que nada aprenderam comigo, mas encontraram por si mesmos, muitas e belas coisas, que já possuíam”.[4] No Menon, Platão confirma que cabe ao filósofo fazer as perguntas certas a seu aluno para que este sozinho alcance as respostas que estavam sempre dentro de si: “Portanto, possui realmente ciência se a extrai de si mesmo interrogando-o, e sem que ninguém o ensine”



[1] MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo: desde Aristóteles até os neoplatônicos, São Paulo: Mestre Jou, 1973, p. 248

[2] WILLIAMS, Bernard. Filosofia, In: FINLEY, Moses. O legado da Grécia, Brasília: UNB, 1998, p. 262

[3] MASCHIO, E. Platão: a verdade está em outro lugar, São Paulo: Salvat, 2015, p.35

[4] MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo: v.I, São Paulo: Mestre Jou, 1964, p. 164



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Doação de Constantino

  Marc Bloch observa a ocorrência de falsificações piedosas tais como a pseudo doação de Constantino ( Constitutum Donatio Constantini ) ao ...