João José Res mostra como o trabalho realizado pelos
negros nagôs na Bahia no século XIX nos chamados “cantos de trabalho” nas
ruas da cidade trabalhando como autônomos (artesãos, lavadeiras, alfaiates,
vendedores ambulantes, aguadeiros, barbeiros, artistas, pedreiros,
carpinteiros, carregadores de carga e de cadeira de arruar), como “escravos de
ganho” constitui um locus importante para o redimensionamento das identidades
africanas e criação de novos laços de solidariedade.[1] João
Reis estima que um escravo de ganho, poderia poupar o suficiente para comprar
sua alforria em nove anos de trabalho.[2] Katia
Mattoso registra que na população livre de Salvador do século XIX de um grupo
de 395 pessoas um total de 25 era formada de ex escravos africanos, do quais apenas
quatro não tinham seus próprios escravos, sendo que, a pesquisa mostra que
todos os artesãos da amostra tinham escravos. Em Serro Frio em Minas Gerais um
grupo de 286 proprietárias de escravos mostra que 244 já haviam sido escravas[3]. Carlos
Eugênio Líbano Soares em pesquisa a registros de Salvador de 1700 a 1751 mostra
que “um número espantoso de escravos possuía escravos”[4]. Jean
Debret se refere a “vaidade de um escravo operário de um homem rico,
mandando carregar, por negros de ganho, seu banco de carpinteiro ao se
encaminhar para o trabalho”.[5] Henry
Koster relata o caso do escravo Nicolau, um homem elegante que tinha dois
escravos: “ele ofereceu seus dois escravos e troca da liberdade própria, mas
lhe disseram que a propriedade não ficaria convenientemente administrada sem
sua assistência. Assim, contra todas as inclinações pessoais, ele continua
escravizado”. Segundo James Wetherell para estes pequenos proprietários a
posse e o uso de escravos era o único meio de sua subsistência. Para João José
Reis os negros na Bahia mantinham suas raízes africanas onde a escravidão era
uma instituição presente.[6] Para
José Reis na revolta dos malês a influência de movimentos revolucionários
igualitários como os observados no Haiti era reduzida: “nenhuma utopia
igualitária. Isso, sem dúvida decepciona quem espera encontrar heróis
altruístas na história das rebeliões. Os malês eram homens de carne e osso,
limitados pelas perspectivas de seu tempo e lugar. Afinal, qual escravo nunca
desejou de ser senhor ?”.[7] Joaquim Nabuco argumentou com ironia
que a escravidão brasileira era mais democrática que a dos Estados Unidos
porque aqui todos os brasileiros podiam ter escravos inclusive os libertos e os
próprios escravos. O artigo 4º da lei de 1871 permitia aos cativos o direito ao
pecúlio, ou seja, tornava-se possível ao escravo acumular bens, podendo
inclusive transmiti-los aos herdeiros. Por meio deste pecúlio o escravo poderia
conquistar sua alforria, prática bastante generalizada ainda que fosse difícil
acumular os recursos suficientes.[8]
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