terça-feira, 29 de junho de 2021

Teófilo o presbítero e arte em metal

 

Segundo Hilário Franco: “rezar é combater as forças maléficas, contribuindo para a salvação não apenas da alma do próprio monge, mas também de toda a sociedade; trabalhar é afastar a alma de seus inimigos, a ociosidade e o tédio, é alcançar através desta forma de ascese uma fonte de energia. Tanto quanto o trabalho manual, o intelectual, a leitura de textos sagrados, prepara a alma para a oração. Enfim orar é uma forma de trabalho, trabalhar é uma forma de orar”.[1] Uma gravura em metal do Vita et miracula santissimi Patris Benedict de 1579 mostra São Bento no campo trabalhando junto com outros monges.[2] Para Pietro Corsi a regra beneditina teve consequências importantes na constituição de ricas bibliotecas e no aperfeiçoamento das técnicas metalúrgicas.[3] São João Crisóstomo exclamou no final do século IV “felizes aqueles que ganham seu sustento com suas mãos”[4]. O monge beneditino alemão Teófilo, o presbítero, (pseudômio de Roger de Helmarshausen) escreveu um famoso tratado de tecnologia De Diversis Artibus em 1122, em que descreve técnicas de ornamentação de igrejas, na iluminura, afrescos, vitrais, metalurgia e ourivesaria[5], embora ainda a descreva como uma arte a serviço de Deus.[6] Sua referência ao pergaminho bizantino, no primeiro livro de seu tratado, possivelmente é a primeira referência documental no Ocidente para o papel. O segundo livro trata da arte em vidro e o terceiro dos trabalhos em metalurgia.[7] Entre as fórmulas mencionadas encontram-se algumas misturas alquímicas para composição de ouro que incluem cobre, pó de basilisco, sangue humano e ácido. O livro escrito em latim era inacessível ao homem do campo[8]. Teófilo escreve “para auxiliar muitos homens em suas necessidades”.[9]

[1] JUNIOR, Hilário Franco. A idade média nascimento do Ocidente. São Paulo:Brasiliense, 1986, p. 112

[2] SOUZA, Jorge Vitor. Para além do claustro: uma história social da inserção beneditina na américa portuguesa, 1580-1690, Rio de Janeorp, UFF, 2014, p. 208

[3] CORSI, Pietro. Ciência e tecnologia: introdução In: ECO, Umberto. Idade média: bárbaros, cristãos e muçulmanos, v.I, Portugal:Dom Quixote, 2010, p.400

[4] BONILLA, Luis. Breve historia de la técnica y del trabajo, Madrid:Ed. Istmo,1975, p.142

[5] CAMP, L. Sprague de. The ancient engineers, New York: Ballantine Books, 1963, p. 343

[6] WHITE, LYNN. Medieval religion and technology, UCLA, 1978, p.322; DAVIDE, Diego. Manufatura e corporações. In: ECO, Umberto. Idade média: bárbaros, cristãos e muçulmanos, v.I, Portugal:Dom Quixote, 2010, p.270; LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 185, 206; GOFF, Jacques. Trabalho. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean Claude. Dicionário analítico do Ocidente medieval. v.II, São Paulo:Unesp, 2017, p. 628

[7] GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 128

[8] FOSSIER, Robert. O trabalho na idade média. Rio de Janeiro: Vozes, 2018, p. 85

[9] LONG, Pamela. Invention, Authorship, Intellectual Property, and the Origin of Patents: Notes toward a Conceptual History, Technology and Culture, v.32, n.4, Special Issue: Patents and invention, october 1991, p.868



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