Para Henri Pirenne as guildas comerciais (guildes e hansas) surgiram na Alemanha no século X e XI como reunião de mercadores que faziam suas viagens pelas estradas em escolta, em caravanas, como forma de se proteger do ataque dos saqueadores[1]: Edward Thompson mostra que mesmo no século XVIII era costume os artesãos viajarem em busca de trabalho[2]. Lewis Mumford observa que no início não era muito clara a distinção entre artesãos e mercadores.[3] Franco Cardini mostra diversos governos preferiam prolongar indefinidamente as guerras como forma de manter ocupados os soldados mercenários para que estes não ficassem desocupados transformando-se em bandos saqueadores.[4] Segundo Henri Pirenne “é necessário vê-los como bandos armados, cujos membros providos de arcos e espadas, escoltam os cavalos e as carroças carregados de sacos, de fardos e de pipas. Afrente da caravana marcha um porta estandarte. Um chefe, o hangsgraf, ou o deão, exerce a sua autoridade sobre a companhia. Esta é composta por <irmãos> ligados entre si por um juramento de fidelidade. Um estreito espírito de solidariedade anima todo o grupo. As mercadorias são, segundo todas as aparências, compradas e vendidas em comum e os lucros repartidos segundo a quota-parte do contributo de cada um para a associação”.[5] No Livro dos bons exemplos e de boas maneiras do florentino Paolo di Pace publicado no século XIV é recomendado ao leitor: “acautele-se contra sair de sua casa à noite, mas se você for obrigado a sair, então leve com você uma companhia de confiança e uma grande e boa lanterna. Se for a algum lugar perigoso, vá sem dizer a ninguém onde vai. Em outras palavras, se for a Siena, diga que vai a Lucca, e desse modo estará a salvo contra pessoas perversas”.[6] O mercador do século XII, em caravana, mantinha a espada na sela, conforme informa uma constituição de Frederico Barba Ruiva[7]. Edouard Perroy destaca o elo de solidariedade presente na formação das primeiras guildas e relata que as em seu início tratam-se de associações temporárias: “a existência do negociante é também plena de perigos: precisa defender suas riquezas na estrada, resistir aos portageiros prontos a tido lhe tomar, receber dos fregueses nobres, precisa ter coragem e armas, e, para ficar em melhor situação, os mercadores amiúde unem-se e deslocam-se em caravanas”.[8] A intensificação comercial do século XII levou os mercadores a se organizarem em guildas, hansas e fraternidades para proteger suas caravanas de salteadores[9]. Os estatutos da fraternidade de Valenciennes do século XI fazem referência aos perigos perpétuos em terra ou no mar e proíbem qualquer pessoa de abandonar a caravana desde o momento que esta deixa a cidade exigindo ajuda mútua de seus membros durante toda a viagem[10]. Na Holanda do século XVII ainda são apontados a ação de bandos de soldados desempregados que vagavam atacando diligências e viajantes. Era costuma enforcar-se o assaltante preso no próprio local do assalto.[11]
[1] PIRENNE, Henri. As
cidades da idade média, Portugal:Pub. Europa America, 1962, p.101
[2] THOMPSON, E. A formação
da classe operária inglesa – A maldição de Adão, v.2, São Paulo:Paz e Terra,
2012, p. 99
[3] MUMFORD, Lewis. A
cidade na história, São Paulo:Martins Fontes, 1982, p. 295
[4] CARDINI, Franco Guerra
e cruzada. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean Claude. Dicionário analítico do
Ocidente medieval. v.I, São Paulo:Unesp, 2017, p. 542
[5] PIRENNE, Henri. As
cidades da idade média, Portugal:Pub. Europa America, 1962, p.102
[6] HALE, John. Renascença, Rio de Janeiro: José Olympio, 1970, p.58
[7] BLOCH, Marc. A
sociedade feudal, Lisboa:Edições 70, 1982, p.322
[8] PERROY, Edouard. A
idade média: o período da Europa feudal (sec. XI –XIII), tomo III, v. 2, São
Paulo:Difusão Europeia, 1974, p. 31
[9] NUNES, Ruy Afonso da
Costa. História da educação na idade média, Campinas:Kirion, 2018, p.197
[10] DUBY, Georges.
Guerreiros e camponeses: os primórdios do crescimento econômico europeu, sec
VII - XII, Lisboa: Editorial Estampa, p.257
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