domingo, 27 de junho de 2021

O missão dos padres matemáticos preparatória do Acordo de Madri em 1750

 

Em 1720 Deslile o geógrafo do rei francês, perante a Academia Real de Ciências de Paris demonstrara que a colônia de Sacramento estava na soberania espanhola pelo meridiano de Tordesilhas e não portuguesa[1]. D. João V se empenha em resolver a questão da demarcação de terras valendo-se do suporte da ciência de sua época. Nesse sentido mandou vir astrônomos do estrangeiro da Itália, Alemanha e Suíça, encomendou “instrumentos matemáticos”, fundou um observatório astronômico para observação dos satélites de Júpiter enviou em 1729 uma missão de “padres matemáticos” ao Brasil para elaborarem uma nova carta de latitudes e longitudes na colônia de Sacramento. Todo esse aparelhamento custava caro, o novo sextante de Bion, por exemplo, custara seis mil cruzados.[2] A Comissão era formada pelos jesuítas Giovanni Baptista Carbone e Domenico Capacci (ou Domingos Capassi)[3]. Os padres chegaram ao rio de Janeiro em 1730 onde instalaram seu observatório no Colégio da Companhia sobre o morro do Castelo onde puderam fazer o levantamento topográfico da cidade e da Baia de Guanabara em relação ao meridiano de Paris, sendo a primeira representação exata da Baía de Guanabara.[4] Nas observações astronômicas pode contar com suporte do também jesuíta matemático astrônomo Diogo Soares para as primeiras medidas de latitude e longitude do sertão.[5] Por outro lado, já era de conhecimento que áreas como Cuiabá e do Amazonas, excediam em muito a linha imaginária demarcatória prevista no Tratado de Tordesilhas.[6] Segundo Jaime Cortesão não faltam provas documentais de que a missão dos padres matemáticos era a fazer o levantamento topográfico em relação ao meridiano de Tordesilhas mantendo tais medições em sigilo, para que pudessem ser apresentadas em momento oportuno quando na negociação dos acordos de fronteira.[7] Jaime Cortesão observa que a preparação deste empreendimento científico envolveu a contratação de cartógrafos e engenheiros, tais como  bem como o astrônomo cartógrafo jesuíta padre Domingos Capacci, o engenheiro Frederico Jacob Weinholtz, o engenheiro e cartógrafo frei francês Estevão de Loreto, o engenheiro militar húngaro Carlos Mardel, o coronel engenheiro genovês Miguel Angelo Blasco entre outros.[8] Esta teria sido, segundo Jaime Cortesão, a primeira expedição geográfica e cartográfica enviada às Américas por uma nação europeia com um objetivo de Estado tendo em vista a delimitação da soberania política entre os domínios de nações conflitantes.[9] Para Jaime Cortesão os avanços na cartografia no século XVIII tendo como um dos destaques Azevedo Fortes abrem uma nova era na cultura expansionista portuguesa da mesma forma que no século XV a ciência náutica abriu caminho para a era das grandes navegações.[10] Para auxiliar nessa tarefa de cartografia o governador do Rio de Janeiro contará com auxílio do engenheiro José Fernandes Pinto Alpoim, o governador do Maranhão Pará com o cartógrafo José Gonçalves da Fonseca, o governador de Goiás contará com o suporte de Francisco Tosi Colombina enquanto que o governador de Mato Grosso, Antonio Rolim de Moura é também engenheiro.[11] Estes exemplos mostram que as necessidades de cartografia contribuíram para transformar as Academias Militares em “viveiro de engenheiros, geógrafos e cartógrafos”.[12] Jaime Cortesão[13] mostra que os interesses de D. João V não era o de promover a ciência mas políticos: “Ele não fundara uma Academia de Ciências como a de Paris ou Londres. Mas de História (Academia Real de História Portuguesa em 1720). E, em primeiro lugar, eclesiástica. Não lhe importava, como um fim supremo, a busca da verdade e da explicação científica do universo. Mas a valorização moral do português, nas suas relações com Deus. A astronomia não passava aos seus olhos dum instrumento de expansão do seu Império e da sua Fé, bases transcendentes e incomparáveis do seu trono de monarca absoluto”.

[1] CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.265, 274

[2] CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.296

[3] CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.287

[4] CORTESÃO, Jaime. Alexandre de Gusmão e o tratado de Madrid, v.II São Paulo: Funag, 2006, p. 13

[5] RODRIGUES, José Honório. História da história do Brasil, São Paulo: Cia Editora Nacional, 1979, p.164

[6] CORTESÃO, Jaime. Alexandre de Gusmão e o tratado de Madrid, v.I São Paulo: Funag, 2006, p. 42

[7] CORTESÃO, Jaime. Alexandre de Gusmão e o tratado de Madrid, v.II São Paulo: Funag, 2006, p. 14

[8] CORTESÃO, Jaime. Alexandre de Gusmão e o tratado de Madrid, v.I São Paulo: Funag, 2006, p. 93

[9] CORTESÃO, Jaime. Alexandre de Gusmão e o tratado de Madrid, v.II São Paulo: Funag, 2006, p. 25

[10] CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.317

[11] CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.320

[12] CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.291

[13] CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.292



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