terça-feira, 30 de março de 2021

Mercantilismo e o Brasil colonial: os impactos na industrialização

 

Segundo a denominada "Nova História do Capitalismo" tal como proposta por historiadores como Eric Williams(na figura), Edward Baptist e Sven Beckert, a industrialização dos EUA estaria ligada ao acesso a algodão barato, fruto da exploração violenta dos escravizados, de modo que o escravismo não foi um elemento incompatível com o capitalismo, pelo contrário, foi um de seus fundamentos. Eric Williams argumenta que o capitalismo mercantil do século XVIII dependeu dos lucros do tráfico de escravos de  forma que desenvolveu a riqueza da Europa por meio da escravidão assim como do monopólio dos produtos coloniais e com isso ajudou a criar o capitalismo industrial do século XIX. [1] Grandes industriais ingleses como Gascoyne de Liverpool, John Gladstone e John Moss tinham relações próximas ao tráfico de escravos, assim como os empresários de Bristol ligados à Índias Ocidentais eram grandes investidores na Great Western Railway: “a história do crescimento do tráfico de escravos é basicamente a história do desenvolvimento de Liverpool [...] Em 1795 Liverpool respondia  por cinco oitavos do comércio escravo britânico e por três sétimos de todo o comércio escravo europeu”.[2] Numa tentativa de justificar moralmente este sistema mercantil difundiu-se preconceito de que os brancos eram inadequados as rudezas do trabalho nos trópicos e o racismo contra negros: “a ascensão e queda do mercantilismo é a ascensão e queda da escravidão”.[3] Eric Hobsbawn mostra paradoxalmente a revolta de escravos em Santos Domingos / Haiti acabou beneficiando o crescimento dos Estados Unidos como nação industrial pois o fracasso da França napoleônica em retomar o controle do Haiti (1791-1804) levou a liquidação do império francês remanescente nas América o que beneficiou os Estados Unidos que pode adquirir a Louisiana em 1804 com uma área que corresponde atualmente a 23% seu território[4].

Thales Pereira, Nuno Palma, Andrea Papadia e Leonardo Weller testam essa hipótese de que a escravidão era compatível com o capitalismo nascente porque conseguia uma produtividade mais alta, o que levou aos fazendeiros a preferirem a produção escravista à qualquer modernização. A analisando o caso brasileiro no período de boom do algodão, ocorrido quando da guerra de secessão norte americana, que restringiu o fornecimento de algodão por parte daquele país abrindo a possibilidade de produtores alternativos como o Brasil. Maranhão e Ceará, experimentaram esse forte crescimento na produção de algodão, porém enquanto no Maranhão tinha praticamente só trabalho escravo e no Ceará havia somente trabalho livre. Assim, pela hipótese da "Nova História do Capitalismo", a produção do Maranhão deveria ter crescido mais do que aquela do Ceará, no entanto, Thales Pereira pode observar que houve apenas uma diferença marginal nas produtividades das duas províncias, ou seja, o crescimento econômico não ocorreu simplesmente por exploração de mão de obra escrava, de modo que a escravidão não foi capaz de fomentar um capitalismo industrial, pelo contrário ela retardou o início da industrialização no Brasil. [5]

[1] WILLIAMS, Eric. Capitalismo & escravidão, São Paulo: Cia das Letras, 2012, p.284

[2] WILLIAMS, Eric. Capitalismo & escravidão, São Paulo: Cia das Letras, 2012, p.157, 68

[3] WILLIAMS, Eric. Capitalismo & escravidão, São Paulo: Cia das Letras, 2012, p.286, 194

[4] HOBSBWAN, eric. A era das revoluções (1789-1804) , Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996, p.88

[5] Palma, Nuno Pedro G. and Papadia, Andrea and Pereira, Thales and Weller, Leonardo, Slavery and Development in Nineteenth Century Brazil (November 2020). CEPR Discussion Paper No. DP15495, Available at SSRN: https://ssrn.com/abstract=3753894



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