quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

A Reforma da Universidade de Coimbra por Pombal

 

A renovação cultural promovida pelo marquês de Pombal permitiu a maior penetração das teses iluministas em Portugal apesar de seu governo despótico. Os novos estatutos da Universidade de Coimbra em 1772 organizados pela Junta de Providência Literária da ual faziam parte o cardeal da Cunha, o bispo Cenáculo, Francisco Lemos, Ramos de Azevedo e outros[1], criaram as faculdades de matemática e filosofia natural  dotada de observatório astronômico, laboratórios de química e física e jardim botânico. Em 1769 foi criada a imprensa régia em que a censura embora tenha deixado de ser religiosa nem por isso deixou de haver censura política, no entanto o saldo com certeza foi de maior liberdade.[2] O cônego Ribeiro Sanchez expõe este paradoxo: “Este Ministro quis um impossível político; quis civilizar a Nação e ao mesmo tempo fazê-la escrava: quis espalhar a luz das ciências filosóficas e ao mesmo tempo elevar o poder real ao despotismo”.[3] Apesar da renovação promovida por Pombal nos estudos da Universidade de Coimbra [4], Bernardo Pereira de Vasconcelos ao se formar em 1814 refere-se a um ensino conservador: “O direito de resistência, esse baluarte da liberdade era inteiramente proscrito e desgraçado de quem dele se lembrasse. Estas e outras doutrinas se ensinam naquela universidade, e por que ? porque está inteiramente incomunicável com o resto do mundo científico. Ali não se admitem correspondências com as outras Academias; ali não se conferem os graus senão àqueles que estudarem o ranço dos seus compêndios, ali estava aberta continuamente uma inquisição, pronta para mandar às chamas todo aquele que tivesse a desgraça de reconhecer qualquer verdade, ou na religião, ou na jurisprudência ou na política. Daí vinha que o estudante que saída da Universidade de Coimbra devia, antes de tudo, desaprender o que lá se ensinava, e abrir nova carreira de estudos”.[5] João Lucio de Azevedo aponta a reforma de Coimbra por Pombal como incompleta: “Pombal só fizera menção de libertar as inteligências por desagravo aos jesuítas. O seu espírito estava longe, muito longe das ideias que naquela época agitavam a Europa. Com apaziguamento seu a Mesa Censória proscrevia os filósofos Spinoza, Hobbes, La Mettrie, Voltaire, Diderot e quantos outros ! simultaneamente com as produções de fantasia literária, a Nova Heloísa de Rousseau os Contos de La Fontaine e o licencioso Sofá de Crebillon; tudo enfim , que na vida mental do século XVIII representava o arrojo, o saber, o requinte e a graça. Locke podiam-no ler somente aqueles a quem a Mesa facultasse especial licença, e cujo espírito, reconhecidamente calmo, não corresse o risco de se perder na trama de concepções ousadas do inglês. Como estes muitos mais”. João Lúcio de Azevedo acusa Pombal de reformar a Universidade de Coimbra em um misto de “boçalidade fradesca e pedantismo acadêmico”.[6] No Elogio Acadêmico de Maria I lido por Jose Bonifácio na Academia Real de Ciências  de Lisboa em 1817 ele revela que apesar das reformas na Universidade de Coimbra “ainda as ciências  e as letras não tinham  ganhado pés como deviam entre nos; ainda em muita parte nos dominavam os lêmures da filosofia arábigo peripatética, ainda com seus sofismas e argúcias sopeava a razão [...] Não posso negar que no anterior reinado se tinham lançado as primeiras linhas para se estabelecerem as ciências exatas e físicas na universidade, mas não tinham estas deitado ainda as profundas raízes no solo português. Davam0se nosso doutos e aplicados quase exclusivamente a uma pouca filologia latina e quando muito a retórica e poética, mas não sabiam ainda avaliar perfeitamente a soberania das ciências naturais e matemáticas”.[7]

[1]MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo: Queiroz Editor, 1992, p.446

[2] MARQUES, Oliveira. Brevíssima história de Portugal. Rio de Janeiro: Tinta da China , 2016, p.131

[3] COSTA, Cruz. Contribuição à história das ideias no Brasil, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1967, p. 57; BOXER, Charles. O império Colonial português, Lisboa:Edições 70, 1969, p.190

[4] MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo: Queiroz Editor, 1992, p.446

[5] SODRÉ, Nelson Werneck. A história da imprensa no Brasil, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966, p. 118

[6] MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo: Queiroz Editor, 1992, p.449

[7] MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo: Queiroz Editor, 1992, p.449



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