Embora alguns
autores associem a tese geocêntrica como um reflexo do pensamento antropocêntrico,
Dennis Danielson observa que estar no centro do universo não era visto como uma
glória, mas ao contrário como ponto de convergência da matéria mais inferior,
mais rude e mais distante da perfeição [1].
Maimônides (1135-1204) afirmou que “no caso do Universo, quanto mais
próximas estão as partes do centro, maior é sua turbidez, solidez, inércia,
obscuridade e e escuridão porque mais longe estão do elemento mais elevado, da
fonte de luz e brilho”. No comentário ao De Caelo de Aristóteles, Tomás de
Aquino conclui no mesmo sentido: “no universo, a Terra – em torno do qual todas
as esferas circulam e que, como localização, está no centro – é o mais material
e grosseiro de todos os corpos”. [2] Pico de
la Mirandola em Da dignidade humana publicado em 1486 se refere a Terra
como ocupando “as partes imundas e excrementárias do mundo inferior”. Montaigne
em Ensaios publicado em 1568 se refere a posição da terra como “alojados
aqui na poeira e na sujeira do mundo, pregados e fixados na pior e mais morta
parte do universo, no andar mais baixo da casa, o mais longe do arco celestial”.
Denis Danielson mostra que ao colocar o Sol no centro do universo Copernico
estava exaltando o homem e rebaixando o Sol segundo esta visão tradicional do
centro status do centro de universo como algo negativo. No entanto Denis Danielson mostra que para
escapar dessa acusação, Copernico precisou redefinir a posição do centro do
universo como lugar de glória de modo a não rebaixar o Sol quando em seu livro De revolutionibus orbium coelestium
apresenta a tese heliocêntrica exalta a posição do Sol: “Imóvel, no entanto, no meio de tudo está o Sol. Pois nesse mais lindo
templo, quem poria esse candeeiro em outro ou melhor lugar do que esse, do qual
ele pode iluminar tudo ao mesmo tempo ? Pois o Sol não é inapropriadamente
chamado,por alguns povos, de lanterna do universo; de sua mente, por outros; e
de seu governante, por outros ainda [Hermes] o Três Vezes Grande, chama-o de um
deus visível, e Electra, de Sófocles, de onividente”.[3] Para
Frances Yates “o intenso realce dado ao
Sol, nessa nova visão de mundo, era a força propulsora que induziu Copérnico a
empreender cálculos matemáticos, sob a hipótese de que o Sol estava realmente
no centro do sistema planetário; ele desejava tornar aceitável a sua descoberta
apresentando-a dentro do quadro de referências dessa nova atitude”.
[1] CALDEIRA, Henrique. Os antigos NÃO se orgulhavam de estar no centro do
universo!, Estranha História, 2020 https://www.youtube.com/watch?v=QyzNdznzDwc
[2] DANIELSON, Dennis. Mito 6: que as ideias de Copérnico removeram os seres
humanos do centro do Cosmos. In: NUMBERS, Ronald. Terra plana, Galileu na
prisão e outros mitos sobre a ciência e religião, Rio de Janeiro: Thomas Nelson
Brasil, 2020, p. 83
[3] RONAN, Colin. História
Ilustrada da Ciência: Da Renascença à Revolução Científica. v.3, São
Paulo:Jorge Zahar, 2001, p.68; STRATHERN, Paul. O sonho de Mendeleiev: a
verdadeira história da química, Rio de Janeiro:Zahar, 2002, p.64, 98; McCLELLAN
III, James; DORN, Harold. Science and technology
on world history: an introduction. The Johns Hopkins University Press, 1999,
p.210; BRONOWSKI, J. A escalada do homen, São Paulo:Martins Fontes, 1979,
p.197; BRAGA, Marco; GUERRA, Andreia; REIS, Jose Claudio. Breve historia da
ciência moderna, v.II, Rio de Janeiro:Zahar, 2011, p. 73; TATON, René. A
ciência moderna: o Renascimento, tomo II, v.I, São Paulo:Difusão, 1960, p. 70;
CORNELL, Tim; MATHEWS, John. Renascimento v.II ,Grandes Impérios e
Civilizações, Lisboa:Ed. Del Prado, 1997, p. 132; BURTT, Edwin Arthur. As bases
metafísicas da ciência moderna. Brasília: UNB, 1984, p. 44
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