sexta-feira, 12 de junho de 2020

Renascimento e línguas nacionais

No Renascimento Dante, Petrarca e Boccaccio escreveram em toscano[1]. O italiano foi a primeira língua moderna a desenvolver uma forma literária, assim Dante escreveu a Divina Comédia em italiano, Petrarca na poesia lírica e Boccaccio na prosa seguiram seu exemplo. Lutero disseminou a leitura da Bíblia em alemão. Em 1617 foi fundada em Weimar a Sociedade Frutífera para promover o uso do alemão e purifica-lo de palavras estrangeiras.[2]Thomasious escandalizou sua época quando anunciou que faria conferências sobre filosofia na Universidade de Leipzig em 1687 em alemão. O Concílio de Trento em 1562 exigiu que as pregações fossem em vernáculo. Academias literárias foram criadas na Itália com intuito de purificação da língua das quais se destaca a Accademia della Crusca organizada em 1587. Em 1632 quando Galileu Galilei publicou em italiano seu livro Diálogo sobre os dois principais sistemas do mundo, a maior parte dos eruditos europeus ainda fazia suas publicações em latim. [3]O Philosophiae naturalis principia mathematica, de Newton, conhecido como Principiafoi publicado em 1687 em latim.[4] René Descartes escreve o Discurso do Método em em 1637 em francês: “ se escrevo em francês, que é a língua de meu país, e não em latim, que é de meus mestres, é porque espero que aqueles que se servem somente de sua razão natural totalmente pura julgarão melhor minhas opiniões do que aqueles que não acreditam senão nos livros antigos”. Jacques Verger mostra que os homens do saber medieval tinham domínio tanto do latim como de suas línguas nacionais, o que ele denomina diglossie medieval. Desde a alta idade média com a invasão dos bárbaros o latim deixara de ser a língua materna ou mesmo a língua predominante desenvolvendo-se as línguas nacionais italiano, catalão, castelhano, português, langue d’oc e línguas germânicas. Os textos mais antigos em português tratam de um auto de partilhas guardado nos arquivos da Torre do Tombo de 1192 e um testamento de D. Afonso II de 1211.[5]Na Inglaterra o rei ratificou em 1362 a Lei do Direito de Petição que dava direito aos súditos de litigar em inglês. Em algumas décadas o inglês tornou-se instrumento importante de unidade nacional e em 1399 Henrique IV fez seu juramento de posse no idioma inglês. [6]O poeta Geoffrey Chaucer (1340-1400) escreveu suas principais obras em inglês como os Contos de Canterbury (1382).[7]O Beowulf foi composto presumivelmente no século VIII sendo um dos mais antigos poemas em anglo saxão, e tendo uma cópia do ano 1000 guardado no Museu Britânico.[8]George Sarton destaca o paradoxo do Renascimento ao promover os idiomas locais: “a despeito do imenso desenvolvimento de estudos clássicos e a existência de inumeráveis tratados escritos em latim para tod a república das letras, os principais textos em vernacular [publicações nas quais se busca reproduzir a linguagem coloquial da classe média ou trabalhadora] estavam se tornando cada mais fortes e mais ambiciosos a cada ano. A história da Renascença do inglês tão bem contada por Richard Foster Jones [Triumph of the English Language. Stanford University Press, 1953] poderia ser igualmente aplicável aos outros idiomas europeus. A Renascença clássica testemunhou o trinfo do espanhol, português, italiano, francês, alemão, etc, bem como do inglês”.[9]
[1] GONTIJO, Silvana. O mundo em comunicação, Rio de Janeiro:Aeroplano, 2001, p.110
[2] EBY, Frederick. História da educação moderna. Porto Alegre:Globo, 1976, p.123
[3] BYNUM, William. Uma breve história da ciência. Porto Alegre:L&PM Pocket, 2018, p. 84
[4] BYNUM, William. Uma breve história da ciência. Porto Alegre:L&PM Pocket, 2018, p. 118
[5] SABATO, Ernesto. Nosso Universo Maravilhoso, Rio de Janeiro:Brasil Lê, v.III, p.77
[6] MORTIMER, Ian. Séculos de transformações. Rio de Janeiro:DIFEL, 2018, p. 133
[7] LOYN, Henry. Dicionário da idade média. Rio de Janeiro:Jorge Zahar, 1997, p.87
[8]DURANT, Will. História da Civilização, A idade da fé, tomo II, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1957, p.288
[9]SARTON, George. Six wings, men of science in the Renaissance, Bloomington: Indianaa University Press, 1957, p. 13

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