sábado, 13 de junho de 2020

Novidade na idade média

Maurice Dobb observa que enquanto na Idade Média a inovação era tida como um fenômeno ocasional, esta passa a ser inserida no modo de produção capitalista e ser entendida como um fenômeno normal: “hoje se reconhece amplamente que invenções industriais são produtos sociais, no sentido de que, embora tenham uma linhagem independente própria, cada inventor herdando tanto o seu problema quanto alguma ajuda para sua solução de seus antecessores, as perguntas apresentadas à sua mente, bem como os materiais para os seus planos, são modelados pelas circunstâncias e necessidades econômicas da época”.[1] Robert Delort observa que na idade média a ciência antiga era “perfeita e congelada, à qual não podemos aportar nada de novo [...] todos os detalhes incorporados são copiados sem trégua, sem espírito crítico sem qualquer atualização durante todo o período medieval, proveniente da antiguidade e não será exagero dizer junto com Langlois que não o verdadeiro homem de ciência capaz de progresso mas o vulgar tem acredito nas mesmas coisas por mil anos”.[2]Segundo o filósofo Guilherme de Coches ao escrever no século XII: “Nós expomos e formulamos ideias antigas e não inventamos nada de novo”.[3]Para Jacques Le Goff: “Decerto não há outro setor da vida medieval em que o horror às novidades, característico da mentalidade da época, tenha agido com maior força antiprogressista do que na técnica. Nesse setor, inovar era, mais do que em nenhum outro, uma monstruosidade, um pecado. Colocava em perigo o equilíbrio econômico, social e mental. E, como veremos, as inovações que beneficiassem o senhor esbarravam na resistência, violenta ou passiva, das massas”.[4]Para Jacques le Goff na mentalidade medieval inovação é pecado, as invenções são imorais, uma afronta às autoridades do passado de uma sociedade tradicional em que “a verdade é o segredo transmitido de geração em geração[5]. As técnicas eram mantidas em segredo e mesmo em tratados técnicos como o escrito pelo monge alemão Teophile ao escrever De diversis artibus no século XII ele o faz para exaltar o dom dos artesãos do que propriamente em difundir tais técnicas, na medida em que não as revela com suficiência descritiva para sua reprodução. Em Veneza em 1525 quando o Senado decide sobre a construção de uma embarcação rejeita os planos de um mestre artesão em favor de um projeto de quinquerreme imitação dos modelos romanos apresentado por Faustus.[6]Para George Sarton “o temor às novidades foi uma característica da Idade Média”. No árabe o termo bid’a significa novidade, mas também heresia, mesma conotação que assume o espanhol novedad. O latim novitas, por outro lado, não admite este sentido de heresia.[7]
[1] DOBB, Maurice. A evolução do capitalismo, Rio de Janeiro: Zahar, 1973. p. 328
[2] DELORT, Robert. La vie au moyen age, Lausanne:Edita, 1982, p.62, 74
[3] BASCHET, Jérôme. A civilização feudal: do ano mil à colonização da América, São Paulo:Globo, 2006, p.321
[4] LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 185
[5] LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 316
[6] PERNOUD, Régine. Idade Média: o que não nos ensinaram, Rio de Janeiro:Agir, 1994, p. 23
[7]SARTON, George. Six wings, men of sicnce in the Renaissance, Bloomington: Indianaa University Press, 1957, p. 4

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