segunda-feira, 6 de setembro de 2021

O relato não confiável de Heródoto sobre o Egito

 

Heródoto descreveu os construtores de pirâmides como escravos. David Silverman, contudo, observa que esta informação possa ter sido obtida por Heródoto por alguma fonte não confiável. Heródoto também alega, sem qualquer apoio, que o faraó Quéops forçou sua filha à prostituição, a fim de arrecadar fundos para seu projeto de construção da Grande Pirâmide. A jovem exigia um bloco extra de pedra de cada um de seus clientes, para construir sua própria pirâmide. David Silverman, contudo, observa que segundo o registro arqueológico não existe pirâmide para nenhuma das várias filhas de Quéops. A tumba de sua neta, por exemplo, Meresankh III, que recebera a designação de rainha, assumiu a forma de uma mastaba tradicional.[1] Hubert de Novion destaca que o trabalho das pirâmides não era obra de escravos: “na realidade Sakarah é antes obra de trabalhadores compenetrados da importância da sua missão, talvez mesmo o ato de fé coletivo de um povo para com o faraó que encarnava a comunidade”.[2] Kurt Mendelssohn da mesma forma não acredita na construção por escravos e contesta o relato de Heródoto que se refere a construção como resultado da “tirania de Quéops”.[3] Arnold Toynbee destaca que o trabalho coercitivo dificilmente teria sido eficaz na construção dos grandes monumentos do Egito, haveria de ter um significado religioso capaz de mobilizar os trabalhadores[4]. A tumba do arquiteto Nekhebu exalta como virtude o fato dele nunca ter batido em um trabalhador a ponto de derrubá-lo, o que sugere o uso de força[5]. Kurt Lange observa que os blocos de granito inacabado de um tempo inacabado da pirâmide de Miquerinos mostram a presença de pequenas almofadas para proteger as arestas dos blocos de pedra durante o transporte, um preciosismo que dificilmente pode se conciliar com um trabalho realizado por meio da violência: ‘Não testemunham, pelo contrário, um desejo vigilante de perfeição, uma vontade livre e ambiciosa, até mesmo, um entusiasmo religioso ? “[6] A maior parte dos pesquisadores concorda que a escravidão não era uma componente importante da sociedade egípcia mesmo em uma época tardia já no Novo Império.[7]

[1] DAVID, Silverman. Introduction to Ancient Egypt and Its Civilization, Semana 5, The pyramids and the Spinx Part 5, 2021 https://www.coursera.org/learn/introancientegypt/lecture/i1rw5/the-pyramids-and-the-sphinx-part-5

[2] NOVION, Hubert. Sakarah. Readers's Digest. As grandes civilizações desaparecidas, Lisboa:1981, p.29; WHITE, Jon Manchip. O Egito Antigo, Rio de Janeiro:Zahar, 1966, p. 54

[3] WEST, John Anthony. The traveler’s key to ancient Egypt, New York:Quest, 2012, p. 108

[4] TOYNBEE, Arnold. A humanidade e a mãe terra, Rio de Janeiro:Zahar, 1976, p.107

[5] CAMP, L. Sprague de. The ancient engineers, New York: Ballantine Books, 1963, p. 33

[6] LANGE, Kurt. Pirâmides, esfinges e faraós, Belo Horizonte:Itatiaia, 1958, p. 34

[7] STROUHAL, Eugen. A vida no antigo Egito. Barcelona:Folio, 2007, p. 191



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