domingo, 7 de março de 2021

A influência do positivismo

 

Luiz Otávio Ferreira mostra que ao final do século XIX no Brasil o positivismo foi a matriz ideológica que formava um ethos da intelectualidade brasileira.[1] Para Caio Prado Júnior: “pode-se dizer que o positivismo forma o único corpo de ideias mais ou menos completo e coerente que existiu no Brasil na segunda metade do século passado”.[2] Para João Camilo Torres o ideal científico se contrapõe ao ideal militar, como já apontado por Comte (“para Comte reis e soldados são coisas do estado teológico militar”) e tal união no Brasil levou ao detrimento da velha tradição militar e a uma dissolução dos ideais militares e do espírito guerreiro uma vez que o positivismo era claramente antimilitarista.[3] Para Severino Sombra “as ideias de Comte exerceram lamentável influência nas classes armadas, concorrendo para uma paisanização funesta e um revoltante desapego às nossas tradições militares [...] a secreta incompatibilidade entre os espírito científico e o espírito militar indicada por Comte viciou horrivelmente o ensino em nossas escolas militares, arrancando-lhes o caráter essencial dos centros de educação militar, de formação intelectual e moral para a guerra”. [4] Segundo João Camilo Torres na obra O positivismo no Brasil de 1943: “O positivismo surgiu no Brasil para preencher uma lacuna, a que fora aberta em nossa cultura pela ausência de uma filosofia elaborada racionalmente e segundo critérios seguros. Era uma concepção do universo e dos valores elaborada sistemática e rigorosamente e, ao mesmo tempo, irrefutável. Ora, nós não possuíamos então nem ao menos uma teoria do estado exequível, quanto mais uma posição filosófica séria e estável. Possuindo, além disto, o positivismo um grande e acentuado poder construtivo, falava muito de perto a tendências futuras da alma brasileira”[5] Sérgio Buarque de Holanda observa que os historiadores tem superestimado a influência prática do positivismo nos meios militares [6] “exagerou-se, a nosso ver, a influência do positivismo no Brasil. Essa influência existiu, sem dúvida, e teve importância em um momento da nossa história, mas não foi tão poderosa, extensa e decisiva quanto se acredita [...] maior alcance teve, entre nós, naturalmente, o positivismo difuso ou um certo cientificismo que foi, aliás, a característica do espírito do século XIX. O positivismo difuso, com aquele sentido do útil, do imediato, voltado para a ação, foi o que teve vigência positiva no século XIX. Correspondendo mais à índole de nosso espírito, deixou a sua marca na nossa cultura” [7]. De qualquer forma, a partir de 1891 o entusiasmo que o positivismo havia suscitado na elite intelectual brasileira já havia declinado.[8] João Torres observa que a direção de ideias positivistas da república durou apenas de novembro de 1889 a janeiro de 1890 com a saída de Demétrio Ribeiro do governo.[9] Para Emília Viotti a elite intelectual do século XIX, incapaz de se aproximar da massa rural atrasada e ignorante assumiu uma atitude paternalista “em nome do povo” um conceito vago sem representatividade alguma o que justifica sua adesão aos esquemas evolucionistas não revolucionários e positivistas considerando tal ideário o único capaz de fazer frente às oligarquias e levar a cabo a modernização do país: “seu radicalismo se esgota num verbalismo pouco eficiente”.[10]

[1] FERREIRA, Luiz Otávio. Os Politécnicos: ciência e reorganização social segundo o pensamento positivista da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, 1862-1922., Dissertação Mestrado Sociologia e Antropologia, UFRJ, 1989

[2] JUNIOR, Caio Prado. Evolução política do Brasil e outros estudos, Rio de Janeiro:Brasiliense, 1972, p.199

[3] TORRES, João Camilo. O positivismo no Brasil, Brasília: Câmara dos Deputados, 2018, p.86, 89

[4] TORRES, João Camilo. O positivismo no Brasil, Brasília: Câmara dos Deputados, 2018, p.40, 242

[5] MESQUITA, André Campos. Augusto Comte, sociólogo e positivista, São Paulo:Lafonte, 2013, p. 120; TORRES, João Camilo. O positivismo no Brasil, Brasília: Câmara dos Deputados, 2018, p.37

[6] HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil monárquico: declínio e queda do império, t.II, v.4, São Paulo:Difusão, 1971, p.255

[7] HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil monárquico: reações e transações, t.II, v.3, São Paulo:Difusão Europeia, 1967, p.330, 337

[8] COSTA, Cruz. Contribuição à história das ideias no Brasil, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1967, p. 351

[8] TORRES, João Camilo. O positivismo no Brasil, Brasília: Câmara dos Deputados, 2018, p.92

[10] COSTA, Emília Viotti. Da monarquia à República: momentos decisivos, São Paulo:Brasiliense, 1987, p.222, 226, 289, 315



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